Tombados Terreiros no Estado de São Paulo (1990-2019)
O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico, e Turístico do Estado de São Paulo – CONDEPHAAT, na sessão ordinária 1948ª realizada em 28/01/2019, na sede da Secretaria da Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo autorizou o tombamento por unanimidade como “bem cultural” do Estado de São Paulo 5 (cinco) territórios tradicionais de matriz africana: a Casa de Culto Dâmbala Kuere-Rho Bessein – Santo André; o Terreiro de Candomblé de Santa Barbara – São Paulo; o Ilê AfroBrasileiro Odé Lorecy – Embu das Artes; o Ilê Alaketu Asé Airá – São Bernardo do Campo e o Ilê Olá Omi Asé Opo Araka – São Bernardo do Campo, além de tornar o Santuário Nacional da Umbanda – SANU, o terceiro Patrimônio Imaterial registrado no Estado. publicado no D.O. de hoje 09/02/2019 na pag 129.
Lideranças Tradicionais de Matriz Africana após reunião do CONDEPHAAT em 28/01/2019.
A escravização de seres humanos, a diáspora e todo o decorrente marcado pelas diferentes formas de violência a população negra e seus descendentes são referências para a compreensão do processo de desterritorialização e desconstrução de referências e identidades dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana.
O enfrentamento dessas violências, que inclu(em)íam a destruição das relações culturais comunais e de parentesco e as formas de solidariedade construídas nos territórios de origem, exigiu do povo negro a criação de espaços para as tentativas de recriação e revitalização do universo cultural oprimido e fragmentado, para a retomada do contato mítico e místico com a matriz, com a origem, com o continente africano, primórdio tanto geográfico quanto simbólico, fonte do existir original, tomado então como espaço existente ao mesmo tempo no campo físico e no intangível.
"O terreiro (...), afigura-se como a forma social negro-brasileira por excelência, porque além da diversidade existencial e cultural que engendra, é um lugar originário de força ou potência social para uma etnia que experimenta a cidadania em condições desiguais. Através do terreiro e de sua originalidade diante do espaço europeu, obtêm-se traços fortes da subjetividade histórica das classes subalternas no Brasil" (SODRÉ, 1988, p.19).
O racismo estrutural, é sem dúvida, a principal violência por que passam historicamente os povos tradicionais de matriz africana, pois a miúde, afere que a população negra e tudo relacionado a ela não é detentora de humanidade.
Material produzido por Vagner Gonçalves da Silva e Pedro Neto para seminário
Territórios Tradicionais de Matriz Africana Patrimonializados em São Paulo realizado em 10/11/2018.
No Estado de São Paulo o Axé Ilê Obá fundado por Pai Caio de Xangô (Caio Egydio de Souza Aranha (1925 - 1984)), sucedido por Mãe Sylvia de Oxalá (Sylvia Egydio (1935-2014)) e hoje dirigido por Mãe Paula de Oyá, no bairro do Jabaquara na capital paulistana foi o primeiro território tradicional de matriz africana “tombado como bem de Interesse Histórico o espaço sagrado” em 1990.
Desde 1993 o Terreiro de Candomblé Santa Barbara (o mais antigo na cidade de São Paulo) solicita ao CONDEPHAAT sua patrimonialização. Naquele momento, sua fundadora Mãe Manaundê (Julita Lima da Silva (1926 – 2004)) estava presente materialmente, desde 2004, o comando da Comunidade Tradicional de Matriz Africana é realizado por Mãe Pulquéria (Pulquéria Albuquerque Lima)
Material produzido por Vagner Gonçalves da Silva e Pedro Neto para seminário
Territórios Tradicionais de Matriz Africana Patrimonializados em São Paulo realizado em 10/11/2018.
Na esteira, em 2008 é feita solicitação da Casa de Culto Dâmbala Kuere-Rho Bessein – Santo André do Humbono Mejitó Dancy (Alex Leme da Silva (1956-2018)), também fisicamente presente naquele momento, hoje a Comunidade Tradicional de matriz fon-gbe é dirigida pelo Abajigã Fábio (Fábio Elton da Rocha).
Material produzido por Vagner Gonçalves da Silva e Pedro Neto para seminário
Territórios Tradicionais de Matriz Africana Patrimonializados em São Paulo realizado em 10/11/2018.
Em 2014 o Ilê AfroBrasileiro Odé Lorecy – Embu das Artes de Pai Léo de Logunede (Leopoldino Alves Sobrinho).
Material produzido por Vagner Gonçalves da Silva e Pedro Neto para seminário
Territórios Tradicionais de Matriz Africana Patrimonializados em São Paulo realizado em 10/11/2018.
Em 2016 o Ilê Alaketu Asé Airá – São Bernardo do Campo, fundado por Pai Pérsio de Xangô (Pérsio Geraldo da Silva (1949 - 2010)), comandado desde 2011 por Mãe Luizinha, Pai Carlinhos, Pai Giba, Mãe Daniele e Mãe Gui.
Em 2017 o Ilê Olá Omi Asé Opo Araka – São Bernardo do Campo de Mãe Carmem de Oxum e Pai Karlito de Oxumarê.
Material produzido por Vagner Gonçalves da Silva e Pedro Neto para seminário
Territórios Tradicionais de Matriz Africana Patrimonializados em São Paulo realizado em 10/11/2018.
E em 2018 o Santuário Nacional da Umbanda - SANU de Pai Ronaldo Linares.
Material produzido por Vagner Gonçalves da Silva e Pedro Neto para seminário
Territórios Tradicionais de Matriz Africana Patrimonializados em São Paulo realizado em 10/11/2018.
Assim como no processo do Axé Ilê Obá, cujo laudo antropológico também foi realizado pela Profa. Rita Amaral, todas as outras solicitações têm, a participante e elaborada justificativa de pertinência produzida com requintes acadêmicos detalhistas do Prof. Vagner Gonçalves da Silva.
Em novembro e dezembro de 2017 a Profa. Elisabete Mitiko Watanabe da Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico - UPPH da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, órgão que assessora do CONDEPHAAT, realizou visitas técnicas em todos os territórios tradicionais de matriz africana no intento de elaborar a pertinência para as Aberturas de Estudo de Registro e/ou Tombamento.
Em 02/02/2018, as 14 horas na Sede da Superintendência do IPHAN em São Paulo, com a presença de todas as lideranças tradicionais de matriz africana e/ou seus representantes com territórios tradicionais de matriz africana com solicitação de reconhecimento, bem como com a presença de representantes da UPPH/SEC e IPHAN/MinC e do antropólogo Vagner Gonçalves da Silva criaram o Grupo de Trabalho “Territórios Tradicionais de Matriz Africana Tombados” de São Paulo com o objetivo de auxiliar técnica e academicamente ações conjuntas entre sociedade civil e os órgãos de patrimonilização, envolvendo ainda os poderes legislativo, executivo e judiciário.
Ao longo de 2018, o Grupo de Trabalho realizou 6 “seis” reuniões, em todos os “terreiros” com o objetivo de construir junto ao Estado, representado pela Profa. Watanabe, a melhor maneira para salvaguardar seus espaços, sem possíveis injunções burocráticas que, de alguma maneira inviabilizassem o desenvolvimento de suas práticas socioculturais.
O Grupo de Trabalho participou ainda da oitiva solicitada pelo CONDEPHAAT, em 04/06/2018 que autorizou por aclamação a instauração dos processos de preservação.
Também com o intuito de subsidiar os processos e promover a participação da sociedade civil em 10/11/2018, o Grupo de Trabalho, organizou o Seminário: Territórios Tradicionais de Matriz Africana Patrimonializados em São Paulo na sede da Secretaria da Cultura do Estado com a presença de Mãe Paula de Oya do Axé Ilê Obá e de todas as autoridades tradicionais de matriz africana dos demais territórios, além das falas da Profa. Marly Rodrigues (Historiadora); Elisabete Mitiko Watanabe (Técnica da Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico (UPPH); Desirré Ramos Tozi (Doutoranda em Estudos Étnicos e Africanos da UFBA); Vagner Gonçalves da Silva (Antropólogo - USP) e mediação de Marcos Monteiro Rabelo (Técnico de Patrimônio Imaterial da Superintendência do IPHAN em SP).
Ainda em 2019, será lançado uma publicação contendo detalhadamente todas as questões abordadas pelo Grupo de Trabalho “Territórios Tradicionais de Matriz Africana Tombados” de São Paulo.
A participação, organização e articulação das lideranças tradicionais de matriz africana, da academia e dos órgãos de patrimônio construiu um caminho qualificado para que o CONDEPHAAT reconhecesse, finalmente, os territórios tradicionais de matriz africana patrimônio do Estado de São Paulo a partir de um processo participativo, dialógico, obedecendo os Marcos Legais, construindo critérios técnicos. Um aprendizado mútuo.
Sob a presidência Ilmo. Sr. Carlos Augusto Mattei Faggin, a relatoria da vice-presidente Ilma. Sra. Valéria Rossi, com a presença do Ilmo. Sr. Sérgio Sá Leitão - Secretário da Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo que enfatizou: “defendo o rigor técnico e a autonomia deste Conselho”, o CONDEPHAAT declarou por unanimidade em 28/01/2019 os referidos territórios tradicionais de matriz africana Patrimônio do Estado de São Paulo.
Reunião do CONDEPHAAT de 28/01/2019.
foto: Pedro Neto
Agradecemos a todas(os) nossas(os) ancestrais negras(os), divindades e “entidades”, bem como todas(os) membros das comunidades tradicionais de matriz africana e demais parceiras(os) que não foram aqui nominados para não incorrer a injustiça de faltar alguém.
Afinal, é uma luta antiga, não termina agora e está sendo construída a tempos em prol da soberania dos povos e comunidades tradicionais de matriz africana, a partir da elaboração de políticas públicas, baseados na laicidade do Estado e com a compreensão que somos o berço da cultura negra brasileira.
02/02/2018 na Sede da Superintendência do IPHAN em São Paulo na criação do Grupo de Trabalho “Territórios Tradicionais de Matriz Africana Tombados” de São Paulo.