Carnaval, um laboratório a céu aberto
O Carnaval acabou, começa 2024! (mas não sem antes pensar sobre essa festa tão brasileira)
O verbete Cultura Popular no Dicionário do Patrimônio Cultural, do IPHAN, não deixa nenhuma dúvida: “Cultura popular constitui um conceito IMPRECISO, que se presta a definições DIVERSAS.”
Mas não é necessário pesquisar no Dicionário do Patrimônio Cultural para entender que as Culturas pop, Popular, Tradicional, rural ou urbana não ficam paradas à espera das pesquisas acadêmicas. E para quem quer ver de perto o “conceito IMPRECISO” e as “definições DIVERSAS”, o Carnaval continua sendo o nosso imenso laboratório de mudanças a céu aberto.
O FCPT foi convidado a assistir ao 1º Concurso de Bate-Bolas em Mesquita, cidade da Baixada Fluminense. E no dia 12 de Fevereiro, uma segunda-feira, na Pça dos Camarões, no bairro da Chatuba, iniciou-se mais uma “tradição” no Carnaval!
Organizado pelos Centro de Cultura Popular da Baixada Fluminense e o Centro Cultural Miro Cortez, o 1º Concurso de Bate-Bolas em Mesquita, teve à frente Augusto César Cortez e Ivan Machado. Para Machado, o evento foi uma oportunidade de trazer as turmas de bate-bolas para um outro patamar. “A invisibilidade dos movimentos sociais de Cultura nas periferias urbanas está diretamente ligada ao estigma sob o qual vivem essas comunidades”, avalia. O concurso foi importante para “mostrar o potencial criativo dos jovens e um pouco da diversidade cultural da Chatuba de Mesquita, ao mesmo tempo que contribuiu com a elevação da autoestima dessa galera.”
Os bate-bolas foram declarados patrimônio cultural de natureza imaterial da cidade do Rio de Janeiro pela Prefeitura em 2012, e cada geração conhece esse grupo por um nome: bate-bola, Clóvis, pierrô e/ou clown. O historiador Ivan Machado nos ajuda contando sobre esses personagens temidos e admirados em seus territórios.“Os bate-bolas surgem como uma brincadeira adolescente que, na minha opinião, imita as performances dos palhaços de folias de Reis. Já se vão quase meio século, desde que a garotada pedia bexiga de porco nas feiras, pra fazer as bolas com as quais assustavam as crianças menores, com suas marcas toscas. Hoje a influência é a beleza e o colorido das fantasias carnavalescas, também muito comuns entre tantas costureiras, em que parte da produção dos barracões é executada em suas casas”, explica. Essa riqueza de cores e tecidos garantidos na roupa composta por capa, macacão e máscara, traz também os sinais de seu tempo. Se tempos atrás era utilizada a “bexiga de porco” para produzir a bola que bate no chão com o som de explosão, os atuais adeptos das turmas com mais de 20 integrantes que utilizam imagens de games, jogadores de futebol, entre outros símbolos da Cultura Pop.
E para provar que Cultura não para no tempo, uma novidade está fazendo barulho nas ruas da Baixada Fluminense: as bateboletes. A grande diferença no vestuário das meninas é a ausência de máscaras. Uma quase cosplay carnavalesca, a batebolete Laine “abusa” da luz led para complementar o penteado. Quem vai dizer o que está certo e o que está errado nas turmas de bate-bolas que percorrem livremente as ruas dos bairros da Zona Norte, Zona Oeste e Baixada Fluminense? O 1º Concurso de Bate-bolas, de olho na mudança, incluiu a categoria Turma Feminina, além das categorias Bandeira e Bola, e Sombrinha e Boneco (ou adereço). Independente do resultado dos jurados Leandro Macalé, João Carlos, Roberto Cachimbo e do Youtuber Kedson, acompanhar as dinâmicas das transformações das Culturas Populares é com certeza o grande prêmio para nós, brasileiros. Essas mudanças fogem do espectro de morte das estatísticas da violência, da ausência de Educação, Saúde e da pouca compreensão do Poder Público sobre o que somos.
Mas se depender da vontade dos organizadores, o Concurso de Bate-bolas terá vida longa. Para Ivan Machado, o 1º Concurso de Bate-bolas, mesmo sem apoio governamental, foi um sucesso “sobretudo por ocorrer em paz e com o reconhecimento da comunidade”. E ele continua na sua avaliação; “receber o aplauso da própria comunidade é algo impagável àquele jovem que é visto como alguém comum e talvez até com alguma irrelevância na comunidade. Algo que muda quando as luzes de um palco se acendem e o mostram expressando talento e beleza. Penso que essa foi a maior virtude desse primeiro concurso de bate-bolas de Mesquita. E que venha o próximo!”
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